O Vampiro é uma criatura folclórica que se alimenta da essência vital dos vivos. Acompanhando a humanidade desde os primórdios, a figura do morto-vivo vem se manifestando de diversas formas em cada cultura, sendo uma figura muito presente no Leste Europeu (ou Europa Oriental). As narrativas sobre Vampiros circulavam na forma oral, e o primeiro registro escrito do termo, que daria origem a palavra “Vampiro”, foi traçado na Rússia do século XI: O Livro da Profecia, do príncipe Vladimir Jaroslov, datado de 1047, consta com uma palavra de herança do eslavo antigo, upir (vampiro).
Ao longo dos séculos, a construção das características do Vampiro foi favorecida em vários aspectos pela influência folclórica de cada região, sendo que todas elas têm como embasamento o medo da morte e em como evitar que o morto retorne. Ritos e superstições foram surgindo para garantir uma passagem tranquila da alma do falecido para o outro mundo. No entanto, quando o morto não recebe esses cuidados ou é assolado por outras situações que poderiam levar o seu retorno (como vítimas de morte violenta, suicidas, criminosos, excomungados, filhos ilegítimos, etc.), com intuito de se vingar dos vivos ou concluir assuntos inacabados, a figura do Vampiro ganha cada vez mais forma.
No caso do Leste Europeu, os procedimentos de seu folclore deram um passo para o universo literário, tornando-se também convenções da literatura de Vampiros, como por exemplo, o alho e a estaca. Dentre todas as representações culturais, o mito do Vampiro do povo eslavo prevaleceu, e a razão disso veio a partir do Tratado de Passarowitz (1718), onde o Império Austríaco tomou o controle da Servia, Bósnia e Valáquia (hoje parte da Romênia). Com as portas abertas, os países da Europa Ocidental adentraram na região. Nações como Alemanha, França e Reino Unido, tomaram conhecimento de recorrentes relatos sobre Vampiros. Outro momento histórico que propiciou com mais força a inovação da mitologia vampiresca foi às transformações sociais decorrente da Revolução Industrial e da expansão do Império Britânico.
A partir daí, o mito foi disseminado e popularizado através dos boletins e folhetos, como o acessível Penny Dreadful. O Vampiro assumiu inclusive outras formas, passando de uma figura cadavérica, para um ser sofisticado, questionador dos fundamentos da vida, aristocrático, alguns inclusive belos e sedutores. Por isso vale destacar que os Vampiros do sexo feminino foram personagens de suma importância na literatura e que serviram de inspiração para outros autores, pois resgataram as primeiras narrativas mitológicas, representadas por Lilith, Hécate, Lamia e Kali.
Contos Clássicos de Vampiro reúne alguns dos primeiros e mais importantes textos sobre a figura do Vampiro. Selecionado por Bruno Costa, as histórias vampirescas presentes são: Trecho de um romance (Lord Byron), O Vampiro (John Polidori), O hospede de Drácula (Bram Stoker), Porque sangue é vida (Francis Marion Crawford), A morta amorosa (Théophile Gautier), A tumba de Sarah (F.G. Loring), Um episódio da historia da catedral (M.R. James), Vida de Apolônio de Tiana – trecho IV, s25 (Filóstrato), O Vampiro (Heinrich August Ossenfelder), Lenore (Gottfried August Bürger), A noiva do Corinto (Johann Wolfgang von Goethe) e Chistabel (Samuel Taylor Coleridge). Eu gostei de todos os textos selecionados, mas senti um carinho especial pelos escritos de Stoker, Crawford, Loring, James e Bürger.
A publicação original de cada conto, fragmento, relato ou poema, com exceção do texto de Filóstrato que data do século III, as demais narrativas são dos séculos XVIII, XIX e XX. Grande parte dos autores é da Europa Ocidental (Reino Unido, Itália, França e Alemanha), sendo eles o resultado econômico, e consequentemente cultural, da potência de seus respectivos países. Por outro lado, ter incluído o filósofo grego é de alguma forma o resgate da raiz do folclore, pois a Grécia é famosa pelos seres subordinados da Deusa Hécate: Émpousa (come carne humana, consequentemente o sangue) e Mormolúke. Isto é, a coletânea abrange uma excelente seleção que nos dá um panorama da mutação e definições de padrões da figura vampiresca através do tempo, e que inclusive foram textos influentes para outras obras clássicas. Só lamento a falta de autores clássicos do Leste Europeu (*poderia haver uma parte dois desse livro*).
Antes de iniciarmos nossa caminhada na eterna noite, a ótima introdução do pesquisador e professor de Língua Inglesa e Literatura Alexander Meireles da Silva, que aborda sobre o Vampiro desde a antiguidade até os dias de hoje, inclusive passando pela literatura e cinema, ajeita o terreno e informa o leitor sobre tais dados, o preparando para perceber as referências em cada texto. Foram justamente essas alusões que tomei como base para a postagem, visto que elas me instigaram na leitura de Contos Clássicos de Vampiro. Por isso eu gostaria que outros colegas leitores fossem encorajados e chegassem ao objeto com a animação que senti.
Como eu adoro a figura do Vampiro, a leitura desta beldade pálida foi bastante prazerosa e principalmente informativa. Com certeza vale uma releitura. Conhecer um pouco mais da origem do mito, e de outros autores do gênero que ainda não tinha lido, acabou sendo uma experiência enriquecedora. Fiquei feliz de incluí-lo no meu especial de Halloween, e agradeço a Jedi R. pela companhia nesta leitura temática. No mais, Contos Clássicos de Vampiro é leitura obrigatória para todos os fãs da eterna criatura da noite (até os que brilham).
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Título: Contos Clássicos de Vampiro
Autores: Lord Byron, John Polidori, Bram Stoker, Francis Marion Crawford, Théophile Gautier, F.G. Loring, M.R. James, Filóstrato, Heinrich August Ossenfelder, Gottfried August Bürger, Johann Wolfgang von Goethe e Samuel Taylor Coleridge
Tradução: Marta Chiarelli de Miranda, Beatriz Sidou, Marta O’Shea, Beatriz di Paoli, Maria Aparecida Barbosa e Bruno Gambarotto
Editora: Hedra
Páginas: 264
Ano: 2012